quarta-feira, 3 de setembro de 2008

Como funcionam os bafômetros?

Ouvimos e lemos sobre motoristas envolvidos em acidentes que mais tarde são indiciados por terem dirigido embriagados. Geralmente, o noticiário sobre o acidente dirá qual era o nível de álcool no sangue do motorista e qual é o limite legal. Pode acontecer, por exemplo, do nível de álcool no sangue de um motorista ser de 1,5 enquanto o limite legal nos Estados Unidos é de 0,8 (8 decigramas por litro de sangue). No Brasil, desde de julho de 2008, o limite passou a ser de 0,2. A punição prevista na lei seca (lei 11.705), cuja infração é considerada gravíssima, prevê suspensão da carteira de habilitação por um ano, além de multa de R$ 955 e retenção do veículo. Se for constatado nível de álcool no sangue acima de 0,6, o motorista também é detido. A lei é considerada a mais rigorosa entre 63 países.

Mas o que significam esses números? Como os policiais descobrem se um motorista suspeito de ter bebido está mesmo legalmente embriagado? Você provavelmente já ouviu falar no bafômetro, mas pode estar se perguntando como exatamente o hálito de uma pessoa mostra o quanto ela bebeu.

É importante para a segurança pública que os motoristas embriagados sejam tirados das ruas. Das 42 mil mortes no trânsito ocorridas nos Estados Unidos em 1999, cerca de 38% estavam relacionadas com o álcool. No Brasil, mais de 36 mil pessoas morreram, em 2006, vítimas de acidentes de trânsito no Brasil. De acordo com a Associação Brasileira de Estudos de Álcool e Outras Drogas (Abead), em 61% dos acidentes o condutor havia ingerido bebida alcoólica.

Os motoristas que conseguem passar nos testes de sobriedade feitos no acostamento, conseguindo tocar o próprio nariz ou caminhar em linha reta, podem estar mesmo assim quebrando o limite legal de álcool no sangue e serem um risco na estrada. Assim, os policiais usam algumas novas tecnologias para detectar os níveis de álcool em motoristas suspeitos de embriaguez, tirando-os das ruas.


Os policiais usam bafômetros portáteis como este para descobrir se um motorista está com o nível de álcool no sangue acima do limite legal

Muitos policiais em ação dependem de dispositivos de testagem de álcool (o bafômetro é um deles) para determinar a concentração de álcool no sangue de motoristas suspeitos. Neste artigo, examinaremos os princípios científicos e a tecnologia por trás desses dispositivos.

Por que testar?

A intoxicação com álcool é legalmente definida pela concentração de álcool no sangue. Contudo, colher uma amostra de sangue nas ruas para depois analisar em laboratório não é algo prático ou eficiente para deter motoristas suspeitos de estarem dirigindo sem condições ou dirigindo sob a influência do álcool. Os testes de urina para detecção de álcool se mostraram tão impraticáveis nas ruas quanto a coleta de sangue. Havia a necessidade de um método para medir algo que estivesse relacionado com a concentração de álccol no sangue de forma não invasiva ao suspeito.

Na década de 40, os dispositivos para análise de álcool no ar exalado foram desenvolvidos para uso pela polícia. Em 1954, Dr. Robert Borkenstein da polícia do estado de Indiana inventou o bafômetro, o tipo de dispositivo de testagem de álcool usado pela segurança pública atualmente.


Os princípios do teste

O álcool que uma pessoa ingere aparece no hálito porque é absorvido da boca, garganta, estômago e intestinos para a corrente sangüínea.

O álcool não é digerido após a absorção nem sofre modificações químicas na corrente sangüínea. À medida que o sangue passa pelos pulmões, parte do álcool atravessa as membranas dos pequenos sacos de ar dos pulmões (alvéolos) até o ar, pois o álcool evapora de uma solução, ou seja, ele é volátil. A concentração de álcool no ar alveolar está relacionada com a concentração de álcool no sangue. À medida que o álcool no ar alveolar é exalado, pode ser detectado pelo bafômetro. Ao invés de precisar tirar sangue do motorista para testar seu nível de álcool, o policial pode testar o ar exalado no próprio local e saber instantaneamente se há algum motivo para prendê-lo.

Como a concentração de álcool no ar exalado está relacionada com a do sangue, você pode ter uma idéia da concentração de álcool no sangue medindo o álcool na respiração. A proporção entre o álcool do ar expirado e o álcool sangüíneo é de 2.100:1. Isso significa que 2.100 mililitros (ml) de ar alveolar conterão a mesma quantidade de álcool que 1 ml de sangue.

Durante vários anos, o padrão legal para embriaguez nos Estados Unidos foi de 1, mas muitos estados atualmente adotam o padrão 0,8. O governo federal tem forçado os estados a baixarem o limite legal. A American Medical Association diz que uma pessoa pode ficar incapacitada quando o nível de álcool sangüíneo atinge 0,5. Se a concentração de álcool no sangue da pessoa é de 0,8, isso significa que há 0,08 gramas de álcool por 100 ml de sangue ou 8 decigramas de álcool por litro de sangue.

Existem vários dispositivos diferentes usados para medir a concentração de álcool no sangue.


Tipos de dispositivos: bafômetro

Há três tipos principais de dispositivos de teste do ar exalado, que se baseiam em princípios diferentes:
  • bafômetro - usa uma reação química envolvendo o álcool que produz uma mudança de cor;
  • intoxímetro - detecta o álcool através de espectroscopia infravermelha (IV);
  • alco sensor III ou IV - detecta uma reação química do álcool em uma célula de combustível.
Independente do tipo, cada dispositivo tem um bocal, um tubo por onde o suspeito assopra e uma câmara de amostra para onde vai o ar. O resto do dispositivo varia em cada tipo.

Bafômetro
O bafômetro contém:

  • um sistema para colher uma amostra do hálito do suspeito;
  • dois frascos de vidro contendo a mistura para a reação química;
  • um sistema de fotocélulas ligado a um medidor que avalia a mudança de cor associada com a reação química.
Para medir o álcool, o suspeito respira dentro do dispositivo. A amostra de ar borbulha em um dos frascos através de uma mistura de ácido sulfúrico, dicromato de potássio, nitrato de prata e água. O princípio da avaliação se baseia na seguinte reação química:

Nessa reação:

  1. o ácido sulfúrico remove o álcool do ar em uma solução líquida
  2. o álcool reage com o dicromato de potássio para produzir:
    • sulfato de cromo
    • sulfato de potássio
    • ácido acético
    • água
O nitrato de prata é um catalisador, uma substância que faz a reação ocorrer mais rápido, sem participar dela. O ácido sulfúrico, além de remover o álcool do ar, proporciona também a condição de acidez necessária para essa reação.

Durante essa reação o íon dicromato, de cor vermelho-alaranjada, muda de cor para o verde do íon cromo quando este reage com o álcool; o grau de mudança de cor está diretamente relacionado com o nível de álcool no ar exalado. Para determinar a quantidade de álcool naquela amostra de ar, a mistura que sofreu reação é comparada a de um frasco contendo uma mistura que não sofreu reação no sistema de fotocélulas, produzindo uma corrente elétrica que faz a agulha do medidor se mover do seu ponto de repouso. O operador, então, gira um botão para trazer a agulha de volta ao ponto de repouso e lê o nível de álcool a partir do botão: quanto mais o operador precisar girar o botão para retorná-la ao repouso, maior é o nível de álcool.

A química do álcool

O álcool encontrado nas bebidas alcoólicas é o álcool etílico (etanol). A estrutura molecular do etanol tem essa aparência:
H
H3C - C - O - H
H
onde C é carbono, H é hidrogênio, O é oxigênio e cada hífen é uma ligação química entre os átomos. Esclarecendo, as ligações dos três átomos de hidrogênio com o átomo de carbono da esquerda não estão representadas.

O grupo OH (O - H) na molécula é que faz com que ela seja um álcool. Há quatro tipos de ligações nessa molécula:

  • carbono-carbono (C - C)
  • carbono-hidrogênio (C - H)
  • carbono-oxigênio (C - O)
  • oxigênio-hidrogênio (O - H)
As ligações químicas entre os átomos são pares compartilhados de elétrons. As ligações químicas são parecidas com molas: elas podem dobrar e esticar. Essas propriedades são importantes na detecção do etanol em uma amostra usando espectroscopia infravermelha (IV).

Tipos de aparelhos: intoxímetro

Esse dispositivo usa espectroscopia infravermelha (IV), que identifica as moléculas com base no modo como absorvem a luz infravermelha.

As moléculas ficam vibrando constantemente e essas vibrações se modificam quando as moléculas absorvem a luz infravermelha. As mudanças na vibração incluem o dobrar e esticar de várias ligações. Cada tipo de ligação dentro de uma molécula absorve luz infravermelha de comprimentos de onda diferentes. Assim, para identificar etanol em uma amostra, é preciso analisar os comprimentos de onda das ligações no etanol (C-O, O-H, C-H, C-C) e medir a absorção da luz infravermelha. Os comprimentos de onda absorvidos ajudam a identificar substâncias como o etanol e a quantidade de absorção de luz infravermelha nos diz quanto etanol há ali.



Representação gráfica do Intoxímetro

No intoxímetro:

  1. uma lâmpada gera um feixe de luz infravermelha de banda larga (múltiplos comprimentos de onda);
  2. o feixe de luz infravermelha de banda larga passa pela câmara de amostra e é focalizado por uma lente sobre uma roda giratória com filtros;
  3. a roda com filtros contém filtros de banda estreita específicos para os comprimentos de onda das ligações do etanol. A luz que passa por cada filtro é detectada pela fotocélula, onde é convertida em pulso elétrico;
  4. o pulso elétrico se liga ao microprocessador, que interpreta os pulsos e calcula a concentração de álcool no sangue com base na absorção de luz infravermelha.

Tipos de dispositivos: alco sensor III ou IV

A tecnologia moderna de células de combustível, que poderá algum dia gerar energia para nossos carros e mesmo para nossas casas, tem sido aplicada nos detectores de álcool no ar exalado. Dispositivos como o alco sensor III e IV usam células eletroquímicas.

A célula de combustível tem dois eletrodos de platina com um material poroso ácido-eletrolítico colocado entre eles. À medida que o ar exalado pelo suspeito flui de um lado para outro da célula de combustível, a platina oxida o álcool que houver no ar produzindo ácido acético, prótons e elétrons.

Oxidação do álcool

Se você tirar os hidrogênios do carbono direito do etanol, na presença de oxigênio, você obterá ácido acético, o componente principal do vinagre. A estrutura molecular do ácido acético tem essa aparência:
O
||
H3C - C - O - H

onde C é carbono, H é hidrogênio, O é oxigênio, o hífen é uma ligação química simples entre os átomos e o símbolo || é uma ligação dupla entre os átomos. Esclarecendo, as ligações dos três átomos de hidrogênio com o átomo do carbono esquerdo não estão representadas. Quando o etanol é oxidado em ácido acético, são também produzidos dois prótons e dois elétrons.

Os elétrons fluem através de um fio que vem do eletrodo de platina. O fio é conectado a um medidor de corrente elétrica e o eletrodo de platina do outro lado. Os prótons movem-se através da porção inferior da célula combustível e combinam-se com oxigênio e os elétrons do outro lado para formar água. Quanto mais o álcool se torna oxidado, maior a corrente elétrica. Um microprocessador mede a corrente elétrica e calcula a concentração de álcool no sangue.

Os operadores que fazem o teste em qualquer dispositivo precisam ser treinados no uso e calibragem do aparelho, especialmente se os resultados forem usados como provas no julgamento de motoristas flagrados dirigindo embriagados. Os policiais podem carregar bafômetros portáteis que usam o mesmo princípio dos aparelhos grandes. Contudo, como julgamentos podem aumentar a percepção de precisão de um teste de bafômetro, promotores confiam nos resultados obtidos com aparelhos completos.

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